“O sertão é o mundo.” Essa frase icônica, tirada da obra-prima de João Guimarães Rosa, “Grande Sertão: Veredas”, resume a profundidade e a universalidade de um dos maiores clássicos da literatura brasileira. Mas qual a real importância deste livro e de seu autor, e como a presença das veredas contribui para essa grandiosidade?
Guimarães Rosa: O Mago da Palavra e do Sertão
Guimarães Rosa (1908-1967) foi muito mais que um escritor; ele foi um inovador da linguagem, um explorador da alma humana e um etnógrafo das profundezas do sertão brasileiro. Com uma prosa única, repleta de neologismos, inversões sintáticas e regionalismos que transcendem o local, Rosa criou um universo particular que, ao mesmo tempo, reflete questões universais sobre o bem e o mal, o amor, a fé, a dúvida e a própria existência.
“Grande Sertão: Veredas”, seu único romance, publicado em 1956, é um marco. Narrado em um longo monólogo pelo ex-jagunço Riobaldo, o livro nos mergulha em suas memórias, divagações e conflitos internos. A história, que se passa no sertão de Minas Gerais, Goiás e Bahia, é um épico de amor (entre Riobaldo e Diadorim), guerra (entre grupos de jagunços) e uma incessante busca por sentido. A obra é elogiada por sua originalidade de estilo, que mimetiza a oralidade do sertanejo e eleva a um nível poético a fala do povo. É uma verdadeira “travessia” não só geográfica, mas também psicológica e filosófica.
A Importância da Vereda: O Pulmão do Sertão no Coração da Narrativa
No coração do Cerrado, as veredas são verdadeiros oásis de vida. Elas são formações vegetais que se desenvolvem nas proximidades de nascentes e cursos d’água, funcionando como “veias” que drenam e contribuem para a perenidade dos rios. Caracterizadas pela presença majestosa do buriti e por solos ricos em água (hidromórficos), as veredas são essenciais para a manutenção da biodiversidade e do equilíbrio hídrico em um bioma tão vasto e muitas vezes seco como o Cerrado. Elas servem como refúgios para a fauna, fornecem água para comunidades e formam paisagens de beleza ímpar.
Em “Grande Sertão: Veredas”, a vereda não é apenas um cenário, mas um elemento vital para a narrativa e para a própria simbologia do livro. As veredas representam a vida, a esperança, o refúgio e o contraste com a aridez e a dureza do sertão. Elas são os locais onde a água brota, onde a vegetação se adensa e onde os personagens encontram momentos de pausa, reflexão ou de embates decisivos. A travessia das veredas por Riobaldo e seu bando não é só um deslocamento físico, mas uma jornada interna, repleta de descobertas e confrontos.
Guimarães Rosa soube como ninguém usar a paisagem sertaneja como espelho da alma humana. As veredas, com sua exuberância e vitalidade, contrastam com a secura do sertão, refletindo os momentos de clareza e de confusão, de esperança e desespero que Riobaldo vivencia. A forma como o autor descreve esses ambientes naturais eleva a sua importância, transformando-os em personagens silenciosos, mas essenciais, da trama.
Legado e Relevância
A importância de Guimarães Rosa e de “Grande Sertão: Veredas” é “gigante”, como diria a professora Yudith Rosenbaum da FFLCH-USP. A obra é um estudo profundo da condição humana, da complexidade das relações e da incessante busca por um sentido na vida. Além disso, Rosa revolucionou a forma de se fazer literatura no Brasil, influenciando gerações de escritores e elevando o regionalismo a uma dimensão universal.
Ao destacar as veredas, o livro também ressalta, de forma intrínseca e poética, a importância ecológica desses ecossistemas. Sem a água e a vida que as veredas representam, o sertão seria um lugar ainda mais árido, e a jornada de Riobaldo perderia parte de seu significado. A obra nos convida a refletir sobre a interconexão entre o homem e a natureza, e como o ambiente molda e é moldado pelas experiências humanas.
Para Aprofundar seus Estudos:
- Artigos acadêmicos em plataformas como SciELO: Busque por termos como “Grande Sertão: Veredas”, “Guimarães Rosa” e “veredas” para encontrar estudos aprofundados sobre a obra, sua linguagem e o papel do ambiente.
- “Trilhas do Grande Sertão” de Manoel Cavalcanti Proença: Uma obra clássica que explora os aspectos geográficos e culturais do sertão rosiano.
- “O Mundo Misturado: Romance e Experiência em Guimarães Rosa” de Davi Arrigucci Jr.: Uma análise crítica e profunda da obra de Rosa.
- Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF): O site deles possui informações sobre a importância ambiental das veredas no Cerrado.
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